terça-feira, 7 de abril de 2009

Abismo

Zeca não era mais capaz de ignorar seus pensamentos. Era uma questão crucial de sobrevivência, ditada por sua ávida mente que absorvia qualquer modelo, símbolo ou padrão de maneira contumaz. Contudo, seu corpo respondia toscamente a esse processo, negando-lhe, às vezes até os movimentos físicos mais simples e a respiração. Aquela letargia catatônica não fazia nenhum sentido lógico ou ainda, qualquer sentido biológico também. Mas as idéias proliferavam como pragas bíblicas sobre as sinapses adolescentes de Zeca. Dissolviam-se e multiplicavam-se, efervescentes, como sais de fruta, nas turvas águas daquela debilitada consciência oceânica, drasticamente fora de controle, degenerando a ordem básica da normalidade psíquica.
Era difícil sentir e extremamente fácil pensar. Gradualmente a velha onisciência sussurrava-lhe arquétipos desdenhosos, enquanto cochichava com outros que pareciam ali estar, ocultos, como mórbidos expectadores. Contudo, para um moleque de 16 anos esse tipo de conversa soa como uma dissonante arte notória, recitada por um demônio fajuto.
O desconforto sufocante do primeiro momento de supressão sensorial estava diminuindo, mas a questão de quanto tempo ele ficaria daquela forma, era apenas um dos incontáveis pensamentos vagos e furtivos. O espaço estava visivelmente translúcido e distorcido, todavia sua preocupação era paradoxal: indo e vindo, lépida.
Começara a se importar menos. Suas idéias não eram mais dele. Sua cabeça não era mais um recipiente para o cérebro, e não era mais o veículo dos fluxos mentais. O seu eu-pensante estava se dissipando paulatinamente, como quem ingere calmantes de tarja preta para dormir. Entorpecido como um transeunte da avenida Brasil, não conhecia mais nenhuma verbalização qualquer naquele ponto: nem adjetivos, nem substantivos, nem significâncias recém-nascidas. O mundo, as cidades, as pessoas e os objetos flutuavam dentro de bolhas de consciência fragmentada. As camadas mais sutis do universo estavam evidentes e bailavam em elipses caóticas de rotação incompleta.
À sua volta, o quarto rodopiou como um carrossel solto do eixo, e transformou-se em poeira, para enfim, desaparecer dando lugar ao nada. De repente, tudo e todos se consumiram em soturna furtividade, e alguém apagou a singela luz que ainda permanecia nesse vazio e o grito saiu da alma:
-Nãooooooo!
Porém, aquele majestoso advérbio de negação soou minguante... Nenhuma resposta, a não ser a escuridão silente e um eco distante da tentativa inútil de preencher a vacuidade. Assim, pensamento e linguagem vagaram inertes por nove anos.

5 comentários:

Jonatas Tosta disse...

Sinto que estamos prestes a conhecer algo maior que nós mesmos, maior que o próprio Universo...

João e Maria disse...

O ritmo esta muito bom, se continuar assim fara muito sucesso!

Jonatas Tosta disse...

Cara! Agora sim o leiauti está como você diz mesmo: PIROTECNICO! Muito maneiro mesmo!

мลktub disse...

Está bem legal, colorido...
o texto q eu li "abismo"
está mt bom, não é cansativo, ou mt prolixo
e deixa uma sensação de quero mais
está bem escrito, despertando uma certa curiosidade.
Depois fuço melhor o blog
mas até agora gostei do q li.

Mônica Vallim disse...

Só p dar uma certa autenticidade ao post acima... rs... O texto está realmente mt bom!

Adivinhe só quem está contando...

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